16 de ago. de 2009

Adeus Pina Baush





Faleceu algumas semanas atrás, Pina Baush, alemã de 69 anos e uma das mais importantes coreógrafas do mundo. Seu trabalho era tão respeitado que em todos os países onde se apresentava, os ingressos esgotavam assim que eram postos à venda.


Pina trouxe seus espetáculos ao Brasil diversas vezes. E sempre bombava. Ela adorava o Brasil e sua extraordinária musicalidade. Pina morreu apenas apenas cinco dias depois de descobrir que estava com câncer.


Pina também foi uma das pessoas mais elegantes com quem tive o prazer de conviver, e trabalhar, quando eu morava em Roma.


Tudo começou em outubro de 2000, quando eu visitava a casa de uma amiga muito querida, Ninni Romeo, e que trabalhava na produção de um muito aguardado espetáculo de Pina.


Conversa vai, conversa vem, Ninni menciona que um dos bailarinos, que fazia o papel de garçom, havia adoecido e Pina procurava alguém para cobrir a vaga. Logo acrescenta que eu poderia assumir o papel. Depois de rir muito da absurda proposta, só por curtição acabei aceitando encontrar com Pina para saber se eu tinha o biotipo para o papel do garçom que estava faltando.


Dias depois, num almoço na casa de Ninni, conheci Pina, uma pessoa calmíssima e com a gentileza e humildade característica dos gênios. Ela disse que eu era perfeito para representar o garçom. Pouco depois nos encontramos no Teatro Argentina, uma das mais antigas e belas casas de espetáculo de Roma, com muitos andares de veludo vermelho e dourado.


Comecei logo a ensaiar junto com os bailarinos. Eu entrava em cena apenas nos últimos três minutos do espetáculo “O Dido”, e minha função era apenas entrar em cena vestido de terno e gravata borboleta, servir expressos numa bandeja para os seis casais de bailarinos que paravam momentaneamente, bebiam o café que eu oferecia e o espetáculo terminava.


Pina reclamou algumas vezes comigo porque eu oferecia o café “com excessiva gentileza”. No espetáculo o garçom tinha que ser rude, pois segundo me explicou, meu papel era de um garçom italiano, e que “não há garçons italianos gentis”. Logo aprendi a interpretar grosseiramente e ela me deixou em paz.


Durante uma semana de sonho entrei em cena lá pelas 10:30 da noite, cabelo engomado liso, com minha bandeja de pequenas xícaras (vazias) de café. Servia aos bailarinos diante de uma platéia monumental, pois os ingressos tinham se esgotado semanas antes, e imediatamente o espetáculo acabava.


Quando a cortina se fechava, eu, figura insignificante numa apresentação daquela magnitude, ficava parado NO MEIO do palco e todos os bailarinos vinham se juntar a mim para agradecer aos aplausos. Sentia-me como uma grande estrela apesar da minha minúscula participação. Nunca fui tão aclamado e aplaudido por tão pouco esforço e por uma platéia tão seleta. E ainda era pago pela minha brevíssima atuação!


Mas na primeira noite minha surpresa foi ainda maior quando, ao fim do espetáculo, vindo da platéia que aplaudia longamente, ouvi gritos de “Bravo Tito!”, obviamente uma brincadeira de algum conhecido. O público gostava tanto do espetáculo que os bailarinos voltavam seis, sete vezes, para agradecer, e os aplausos não paravam.


Após a terceira rodada de aplausos Pina vinha se juntar aos bailarinos que curvavam-se agradecendo ao público... e eu, inacreditavelmente, no meio de tudo isso.


No dia seguinte descobri quem era o autor dos gritos com meu nome, o sociólogo italiano, e amigo, Domenico De Masi, e sua adorável esposa, Suzi, que na platéia divertiam-se com meu evidente embaraço naquela cena inacreditável que estava vivendo.


Durante os aplausos, entre uma abertura e outra das cortinas, fiquei para trás e tirei fotos tremendo de emoção, pois a cena era absolutamente inesquecível. Aqui, neste blog, publico estas fotos pela primeira vez.


Saudades Pina! Você fará falta ao mundo.

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